Ov Intimates

Para fechar nossa campanha de conteúdo sobre maternidade, entrevistamos ninguém menos do que a ovelha estrela da nossa campanha de maternidade, Távia Jucksch, que se doou enormemente para nós em fotos e conteúdo, e topou mostrar pro mundo que grávidas podem ser sexys sim, e que na verdade elas podem ser o que elas quiserem, quando quiserem, como quiserem. Se prepara, senta confortavelmente aí, porque você vai precisar de fôlego pra ler até o final.

Blog da Ov: Távia, como você está? Sei que pode parecer uma pergunta estranha, mas ouço muito das mães que as pessoas param de perguntar isso depois que o bebê nasce. Então, queremos saber de você primeiro ♥

Távia: Estou ótima! E não é uma pergunta estranha não, é muito importante levantar isso. Na verdade, não é algo que começa na maternidade, vem desde o começo com a gravidez.

Ao anunciar a gravidez – se for algo desejado, as pessoas ficam muito felizes por você e celebram isso, mas é o último momento que você é o assunto. Infelizmente é natural, mas durante esse período as pessoas se afastam. Cada um tem seu ritmo de vida, e a gravidez te leva para um ritmo muito diferente. Como são 10 meses, depois de um tempo as pessoas realmente se afastam e esperam o bebê nascer (a próxima novidade).

É mais intenso quando o bebê nasce, com certeza, mas isso é uma questão muito complicada para a mulher puerpéria:
A gente passa 10 meses (sim, são 10 ou 40 semanas) desenvolvendo o bebê na barriga, e esse processo (independentemente se foi lindo para a mulher ou não) exige muito esforço, energia, resiliência e sanidade mental. Chega então o parto e passamos por certo trauma – digo trauma não necessariamente no sentido negativo, mas como algo impactante demais para o corpo físico e mental. Não existe tempo ou espaço de recuperação, logo após o parto, estamos machucadas e já passamos a primeira noite em claro amamentando e lidando com os desafios de um bebê que ainda não conhecemos. O descanso existe apenas quando a mulher se adapta ao novo ritmo, porque não é mais o mesmo descanso que ela teria antes. Além disso, nosso corpo recebe níveis altíssimos de ocitocina, hormônio que nos faz sentir o amor pelo bebê, de forma que não conseguimos prestar atenção a nenhuma outra coisa.

Nas primeiras semanas pós parto essa ligação mãe-bebê é fortíssima, junte isso ao cansaço de 10 meses e parto, seguidos das primeiras noites em claro e: a mulher nunca esteve tão machucada e vulnerável. Tudo isso, acaba sendo deixado de lado pelo novo sentimento enorme de proteção ao filho. Até aí, tudo ok, mas é então que chegam as pessoas que mal acompanharam a gravidez, invadindo esse espaço extremamente delicado, e fazem perguntas sobre a grande novidade: o recém nascido. Isso é como um soco na boca do estômago da mulher, que além de machucada é ignorada. Infelizmente é tão comum que chega a ser quase obrigatório. Essa situação é responsável por muitas mulheres sofrerem depressão pós parto. É responsável também por deixar o puerpério um processo muito mais dolorido.

Então sim, sempre, SEMPRE dê atenção para a mãe por primeiro. O bebê está bem, está sendo cuidado, já que os pais estão descobrindo como cuidar dele. Mas a mãe está desesperadamente precisando dos reais cuidados. Antes do parto, minha terapeuta disse: “lembre, Távia, que quem vai precisar dos cuidados vai ser você. Você vai saber cuidar do seu bebê, e as pessoas precisam cuidar de você, não dela. Seu marido vai precisar cuidar de você, não dela.”

Me sinto muito feliz e privilegiada em poder dizer que comigo foi assim, estou agora saindo do puerpério e me sentindo cuidada. Mesmo assim, senti na pele tudo isso. Pedi que ninguém fosse na maternidade no dia do parto. Meus pais foram, mas não chegaram a me ver, ouviram da enfermeira que eu e a Cora estávamos bem, e foram embora. Meus sogros viram a Cora com o Marcus (meu marido) enquanto eu estava com a enfermeira tomando banho. Agradeço muito a todos eles, naquele momento eu só precisava ficar com o Marcus e minha filha. Na semana seguinte, mesmo as pouquíssimas visitas que eu permiti, me machucaram. Eu não estava pronta para dividir a Cora com ninguém ainda, e foi muito confuso ver as pessoas pegando ela e se divertindo enquanto eu estava deitada na cama de fralda, cabelo oleoso, dores e muito, mas muito sono e cansaço.

Blog da Ov: E como foi a sua relação com a sua sexualidade durante a gravidez?

Távia: Até o quarto mês estava normal. Entre eu e o Marcus não existiu tabu em momento algum, a gente sabia que se eu quisesse, nossa vida sexual continuaria igual. Mas no quarto mês eu senti a Cora mexer pela primeira vez, e isso causou em mim um desconforto grande. Não consegui mais depois disso, mesmo achando super natural. Inclusive a masturbação, eu abandonei tudo. Muita coisa muda, minha atenção tornou para a gravidez, e nesse momento me perdi até a divisão de o que era eu, e até que ponto eu me tornava uma barriga. A libido foi por água a baixo, e resolvi deixar isso de lado mesmo, não quis me forçar a nada. Tinha muito medo de a Cora mexer no momento errado e me dar um bugue (hahahha).

As mudanças no meu corpo também mudaram a forma como eu me sentia. Me via muito bonita, de uma forma poderosa, mas não consegui mais enxergar sexualidade em mim, ou que eu fosse uma pessoa sexualizável. Aceitei também, me entreguei para o que estava vivendo. Infelizmente, nós mulheres estamos acostumadas com homens frágeis que não sabem lidar com essas situações, o que nos faz sentir sortudas com os homens que sabem, e não deveria ser tão comemorativo assim. De qualquer forma, foi o meu caso e me senti sortuda, o que foi algo bem positivo para o processo também.

Blog da Ov: Como foram as primeiras semanas/meses com o bebê? Mudou muito em relação a como era antes?

Távia: Bem, eu pari faz 2 meses apenas. O puerpério médico dura 40 dias, apesar de muitas psicólogas considerarem que a mulher precisa de mais tempo para se reestruturar. De qualquer forma, durante esse tempo não se pode ter relações sexuais. A libido está voltando aos poucos, mas mesmo já estando liberada pela médica ainda não me senti segura o bastante. Aos poucos estou voltando a me sentir sensual, mas é um processo. Ainda sinto sequelas físicas do parto, isso que está me segurando por enquanto. Cada mulher tem seu processo, é muito importante respeitar isso.

Blog da Ov: Qual a principal questão para você durante este período?

Távia: O corpo. Desde o resultado positivo o nosso corpo vira uma metamorfose ambulante. Cada mês tá de um jeito e fica difícil de acompanhar (hahaha).

Foi (assim como deve ser para toda mulher) um processo amar meu corpo antes da gravidez. Então agora é tudo novidade para mim, eu saí dos meus padrões. Eu descobri novos formatos, sinto que tenho um corpo mais de mulher, mais forte, mais bonito, mas ainda não consegui sincronizar com a minha sexualidade. Ainda não deu tempo de honrar esse corpo, de enxergá-lo como meu, de me atrair por ele. As alterações transformaram ele em um corpo bonito, mas num padrão diferente do antigo: as estrias, a flacidez e a barriga me incomodam, mas também não sei até que ponto quero que vão embora, elas trouxeram a minha filha. Estou processando ainda, mas não tenho certeza ainda se gosto dessas novas características. E acho difícil pensar em sexo nesse meio tempo. O Marcus me lembra o tempo todo de como eu estou bonita e eu acredito, mas ainda não estou em sintonia.

Blog da Ov: De alguma forma, você acredita que ao longo deste período, os estímulos para se sentir atraída/desejada/com tesão mudaram de alguma forma?

Távia: Muito. Ver o poder do meu corpo e alma mudou completamente minha visão de mundo e de mim mesma. Muitas vezes vejo fotos de como eu era e penso em como era toda linda kkkk aí penso se queria voltar a ser assim e concluo que não. Eu pesava 47kg e era cuidadosa com a minha barriga em fotos. E ainda jurava que não tinha problema com a minha aparência. Hoje dou risada disso. Minha barriga esticou a ponto de carregar por 41 semanas uma pessoa de quase 4kg. Passei para os 60kg para criar um ser humano por completo, meu peito enche e esvazia todos os dias, as cicatrizes estrias estão lá por isso. Fiquei anêmica de tanto ferro que a guria sugou de mim. Isso transforma meu corpo numa força de outro mundo, isso é muito mais bonito e sexy do que eu nervosa porque viajei e voltei com 2kg a mais.

Então como eu vou sentir tesão com aquele corpo antigo na cabeça? Não tem como. E outra coisa é saber que o Marcus passou pelo processo de ver a mesma coisa. Ele me fala, nas vezes em que me sentindo meio angustiada com a barriga: “Você tá maravilhosa demais, você tá mãe!”.

Então a partir de agora com certeza minha sexualidade é outra e minha forma de pensar sexo também. Sou mãe, e digo isso da forma mais vivida e poderosa possível na minha vida. Estou bem feliz onde estou, e esperando naturalmente a minha nova sexualidade se apoderar desse novo corpo.

Blog da Ov: Já sabemos que você teve um parceiro importante nesse processo (e que não é o caso de todas as mães). Qual, para você, é o papel dessa outra pessoa neste período?

Távia: O papel é: FUNDAMENTAL.

A gravidez foi, pra mim, um tapa na cara. Eu nunca tive tanta empatia antes na vida. Desde o comecinho eu pensava o tempo todo em todas as mulheres do mundo que já passaram por isso. Desde os primeiros meses de enjôo até a forma animalesca do parto, eu pensei muito sobre como isso já era difícil pra mim que tem estabilidade mental e financeira, um parceiro incrível ao meu lado, apoio de todos a minha volta…

Foi essencial a compreensão do Marcus no mês três quando até o cheiro dele me dava enjôo. Foi essencial o carinho dele quando eu perdi a libido no mês cinco. Foi essencial a presença dele quando eu não conseguia mais dormir no mês oito, e foi de uma forma indescritível necessária a participação dele no parto. Não consigo imaginar o trauma que teria sido ter passado por aquilo sozinha, ou com alguém que não soubesse como lidar. Depois do parto, depois de berrar de forma que eu nem sabia que podia, me soltar nos braços dele dizendo que ia morrer, ver ele segurando o choro pra poder sustentar toda aquela necessidade que eu tinha do apoio dele, eu peguei um nojo enorme dos (quase todos) homens que dizem a famosa frase “ah não entrei na sala do parto, não tive estômago para isso”. Perdi respeito por todo e qualquer homem que não esteve lá pra olhar no fundo dos olhos da mulher que virou bicho e dizer “você consegue, eu tô aqui”. Os homens precisam desesperadamente parar de perder tempo afirmando sua masculinidade e simplesmente demonstrar a força que dizem ter.

Blog da Ov: Tem algo que você poderia dizer ou sugerir para mulheres que estão passando por esse período?

Távia: A primeira coisa que eu fiz foi assistir a trilogia documental “O Renascimento do Parto”, tem na Netflix, e ler o livro “A Maternidade e o Encontro com a Própria Sombra” da Laura Gutman, que deveria ser obrigatório para todas as gestantes. Mas, acho complicado sugerir coisas porque cada uma está passando por um processo diferente. Queria poder dizer que o melhor nesse momento é deixar as coisas acontecerem no seu ritmo, mas sei que é muito mais subjetivo que isso. Acho legal repassar tudo na cabeça, enxergar melhor o processo de gravidez e parto. O mundo está muito acostumado a nos diminuir nessa vivência, sendo que é bem pelo contrário. É poder puro.